O discurso corrente entre os entusiastas da “modernidade e do progresso” é que São Paulo é uma cidade culturalmente democrática. Fator, aliás, que impulsiona sua diferenciação e sua média, diante de outras capitais. Podemos falar realmente, que a cidade exerça o Estado de Direito, sob a perspectiva e a propaganda de “Cultura para todos”? E o que afinal, mobiliza setores da sociedade, que buscam no debate, desejos de rupturas? No vocabulário neoliberal, conseqüentemente paulistano, Cultura para todos significa o acesso comum, imediato aos aparelhos do Estado e facilitador ao consumo da arte: gratuidade, acessibilidade, locomoção das periferias para o centro e serviços com opções. Para os intelectuais e os amantes das Belas-Artes: fruição, reflexão, pensamento e emoção. Podemos analisar Cultura sob esta perspectiva em um regime formal da lei, da Constituição e dos princípios dos Direitos Humanos? Em uma metrópole onde as carências se particularizam, e não se universalizam, criando assim, a aparência de participação, deveres e direitos cumpridos, as utilizações dos aparelhos se efetivam de quais maneiras?
Quando analisamos as recentes políticas públicas – se é assim que podemos chamá-las – para este setor, o que nós percebemos? A carência efetiva da participação popular nas escolhas, decisões e apontamentos de novas perspectivas. Inaugura-se uma obra ou um novo evento – como, por exemplo, a Virada Cultural -, e não existe a consulta de quais são as reais necessidades da população. Inútil falar que, é obrigação de qualquer regime de Democracia, não só consultar, mas envolver a todos na construção da programação, ou do novo que abrigará manifestações artísticas e intelectuais. Democrático e de Direito não é somente o acesso aos pontos citados acima – no modelo neoliberal de gestão – mas é também a permissão, o estimulo e a criação de condições para que todos os setores da sociedade reflitam e contribuíam no processo orgânico de uma identidade cultural (Cidadania Cultural). Esse pensamento invertido, além de ser autoritário, não cria as rupturas necessárias a qualquer mudança, e estimula a prática do elitismo, ou a Cultura ditada de cima para baixo. Neste sentido, o artista possui um papel fundamental: não fechar o diálogo com os setores públicos e a sociedade, mas transformá-lo a partir da discussão coletiva. Criam-se então, não mais “apreciadores” e “consumidores” da arte e da Cultura, mas agentes críticos não só do modelo adotado, mas de futuras possibilidades. Caso contrário é estagnação, e a Ideologia da Vanguarda, sob o olhar único e exclusivo dos “especialistas”. Talvez aí, resida o “desespero” e a resistência daqueles que impõem tais políticas na conjuntura atual. Neste modelo, não cabe a divisão recorrente entre centro e periferia. Esta última, aliás, contraria a prática discursiva e dominante de que São Paulo seja culturalmente democrática e para todos, desnudando qualquer sacralização do significado de Democracia. Em uma cidade em que os discursos e a “Cultura” estão privatizados e aparelhados nas mãos de uma minoria, ronda o espectro da “modernidade” e do “progresso” no que se vê, mas não no que se percebe.
By Brunno Almeida Maia.
brunnoalmeida@brrun.com
[Pic: ©advertisement.]